Jim Withers - O Médico das Ruas

Em 1992, Jim Withers, Um médico de Pittsburgh, na Pensilvânia, decidiu deixar o jaleco de lado durante a madrugada. A roupa e os sapatos brancos deram lugar a peças surradas: tudo para parecer um sem-teto. Afinal, se queria que moradores de rua confiassem nele e aceitassem seus cuidados, Jim teria de passar despercebido.

O médico começou a sua prática incomum e extraordinária juntamente com Mike Sallows, um ex-morador de rua. Os dois saíram à noite com mochilas cheias de comida, medicamentos e materiais para pronto-atendimento. Pelas suas contas, ele estima ter tratado mais de 1.200 pessoas desabrigadas por ano desde que começou.

Hoje, sua iniciativa evoluiu para uma rede nacional de estudantes de medicina e voluntários que tratam os moradores de rua, quatro noites por semana. O serviço noturno se tornou uma organização sem fins lucrativos, a Operation Safety Net, que é uma das primeiras ONG’s a oferecer programas de medicina de rua em tempo integral nos Estados Unidos.

Foi assim que ele começou um trabalho que iria durar décadas e se desenrolaria na criação de um movimento muito maior — o Street Medicine Institute. Hoje, o projeto global une pessoas que querem sair nas ruas de sua própria região para cuidar das pessoas que por ali dormem. Mais de 90 comunidades distribuídas pelos EUA, América do Sul, América Central, África, Ásia e Europa fazem parte da iniciativa.


O instituto fomenta a ida de médicos e estudantes de medicina às ruas por meio de reuniões internacionais anuais (nove já aconteceram, a última com 200 participantes de cinco continentes). Tudo com objetivo de incluir na sociedade pessoas totalmente esquecidas. “Acho que a sensação de que estamos construindo, com base no respeito, amor e bom senso, uma comunidade com algumas das pessoas mais desfavorecidas da nossa sociedade é o mais inspirador”, diz Withers, à GALILEU.


O Street Medicine acaba servindo não só a um propósito imediato em termos de salvar vidas, explica o médico, mas também é um modelo de como o sistema de saúde deve tratar a todos. Nos primeiros anos, Withers ia às ruas com um amigo que era ex-sem-teto. “Eu queria atender os desabrigados sem todas as implicações de ser um médico”, conta. “Queria me tornar parte da comunidade, tanto quanto eu pudesse. Foi uma época muito emocionante, às vezes assustadora, muito comovente e algo que eu não conseguia parar de fazer.”



O médico lembra que viu um pouco de como é ser tratado como um morador de rua. “Foi muito humilhante”, resume. “[Depois disso], as pessoas se tornaram muito reais para mim, eu não podia mais virar as costas para elas.” O Street Medicine trabalha em quatro vertentes: ajudar comunidades que procuram estabelecer os seus próprios programas de medicina de rua; definir e melhorar esse tipo de prática; apresentar um seminário internacional; e promover oportunidades educacionais.



HISTÓRIAS DA RUA

Withers está trabalhando em um livro no qual vai relatar as histórias mais marcantes de sua jornada. “Tenho tantas!” Uma delas é de seu primeiro paciente significativo, que se autointitulava “vovô”. Ele tinha 85 anos e sofria com uma doença mental, pensava que estava sendo perseguido por pessoas perigosas o tempo todo. As pernas dele eram muito inchadas, lembra o médico, mas se recusava a ir para ao hospital. “Foi por meio da minha amizade com ele — permitindo que ele me desse dinheiro para comprar um peru de Natal e ouvindo sua história de vida — que, eventualmente, ele deixou que eu conseguisse a ajuda de que ele precisava e o tirasse das ruas”, celebra o médico.

Ele ainda conta ter encontrado um homem que sabia falar híndi, aramaico, sânscrito e grego. “Era um artista incrível, que me mostrou que moradores de rua podem ser mais inteligentes do que nós imaginamos, no entanto, outros fatores os levaram a viver dessa forma.”


UM CAMINHO

Para Withers, contudo, nem todo médico deveria ir para as ruas — alguns têm personalidades que são inadequadas para esse tipo de trabalho. “Não gostaria de mandá-los para os meus amigos sem-teto!” Ainda assim, ele defende que aqueles que vão aprendem a respeitar a realidade dos outros. Essa lição, avalia ele, ajuda os médicos a desenvolver uma capacidade de abordar todas as pessoas com o respeito que merecem.


“Os sem-teto rua deixam a lição de que precisamos para nos tornar mais humanos”, diz. “Precisamos recuperar a nossa profissão (juntamente com enfermeiros e outros) sobre princípios mais profundos do que dinheiro e controle. Esse será um desafio de amor para aqueles médicos que perderam seu caminho.”